No artigo intitulado "Visão geográfica do Brasil atual: Estado, crises e desenvolvimento regional", publicado (2019) na Revista Latino-Americana de Geografia Econômica e Social e apresentado anos antes (2017) no II Seminário Dinâmica Econômica e Desenvolvimento Regional, o professor Armen Mamigonian (1935) expõe o percurso histórico da Geografia até chegar no labirinto em que se encontra atualmente.
Como um primeiro exemplo (ou mesmo contexto) destaco que, em dissonância com Mamigonian, a professora Maria Adélia Aparecida de Souza (1940), discípula mais fiel de Milton Santos, vem defendendo que "existe apenas uma Geografia", cujo objeto de estudo é o "espaço geográfico". Este espaço deve ser pesquisado, nas suas variedades de objetos, por meio da teoria e método formação sócio-espacial (FSE) "de Milton". Souza rejeita a geografia econômica ao mesmo tempo que critica a prevalência de economistas exercendo papéis importantes na gestão da política estatal, como vemos nos quadros do IBGE.
Citado esse ponto de que até entre os grandes rejeita-se "as muitas geografias", escrevo este texto ao chegar do XV Enanpege, realizado em outubro de 2023, na UFT em Palmas. Lá constatei, na prática, a crise que assola a Geografia. Subtraindo os debates do grupo de trabalho (GT 21) que participei tratando da temática energia renovável, onde pude conhecer diversos estudos empíricos destacadamente preocupados com os desafios de desenvolvimento da realidade urbana nacional, o Brasil não esteve em pauta como deveria. Além disso, na terra do terminal multi-modal e onde a ferrovia Norte-Sul corta o território com estoques de combustíveis líquidos instalados e um papel fundamental exercido por um grande rio em um capital planejada, a visita técnica foi apenas turística (com um pouco de história).
Ficou exposto que os "modismos estéreis" estão vivos na Geografia, como coloca Mamigonian, impondo temáticas que julgo como periféricas e algumas até descartáveis para enfrentar os desafios do processo de desenvolvimento colocados hoje. Faltaram diálogos sobre a verdadeira geopolítica, que tem o território como núcleo dos interesses (papel da China e dos EUA na economia, o conflito na Ucrânia e a recente potencialização do embate entre israelenses e palestinos); a questão energética e o processo de transição, uma pauta mundial; planejamento e políticas estatais; e programas de desenvolvimento nacional que assumam a amplitude do caráter da Geografia como disciplina (Teoria de Geosistemas + FSE) que poderiam auxiliar o Brasil em crise.
Essa dificuldade formada historicamente na disciplina aparentemente atinge seu auge e nos ajuda a explicar o deslocamento do seu espaço em órgãos públicos, na academia e no desenvolvimento da atividade de planejamento das empresas privadas. Um resultado desses modismos, mas também de um percurso bem resumido por Mamigonian que passou pela (i) separação da disciplina história; (ii) distanciamento entre a geografia humana e a física; e (iii) deslocamento do estudo da concretude dos processos ao se dar ênfase na espacialização dos fenômenos sem minimamente compeendê-los.
Viu-se no evento da Anpege preocupações com a articulação do mundo acadêmico, a insistência em debates sobre teorias consolidadas, a incansável prática do "marxismo de salão" e a preocupação com muitos dos modismos assumidos como alicerces das crises econômicas e sociais do capitalismo. A Geografia escolheu temáticas que não dão conta da realidade colocada, especialmente em um longo ciclo de crise econômica (desde 1973, a partir da compreensão da teoria dos ciclos de Kondratieff ou ciclos longos) que impõe ao modo de produção prevalente a necessidade de reindustrialização. A crise da Geografia "globalizou-se" na falsa globalização e, assim, perde fundamentos teóricos fundamentais como utilizar o imperialismo e a lutas de classes como bases analíticas.
E qual a saída? No mesmo artigo o professor Armen coloca por onde, como e partir de quais perspectivas teóricas e personalidades a Geografia avançou. Leiam! Aliás, a ausência de Mamigonian e Souza neste evento no Tocantins ajudam a explicar o porquê do labirinto.
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